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Quero muito compartilhar com vocês uma experiência que me fez comprovar que nunca é tarde. Nem mesmo para uma autista com diagnóstico tardio. Seguinte: Quando minha mãe completou 45 anos ela conseguiu comprar um fusca 69 e tirar carteira de motorista. Foi o que bastou para todas as 3 filhas, com 18 anos recém completados, fizessem o mesmo.
Minha irmã mais velha, iniciando a vida de engenheira resolveu tirar carteira na categoria A. Ou seja, iria aprender a dirigir em um ônibus. Passou de primeira. A caçula costuma vomitar quando está muito ansiosa, o que tirou a confiança dos examinadores. Resultado: ela tirou na segunda tentativa. E eu? Bem…
A saga da carteira de motorista
Até aquele momento, eu havia passado em todos os desafios preparados para a vida jovem. Assim, minhas notas sempre foram excelentes, passei direto no vestibular, mas, a carteira… ah, a carteira. Eu tentava entender racionalmente a ação de dirigir. Em outras palavras, eu precisava entender a máquina que seria guiada sob o meu comando. Entretanto…
Minha origem humilde não me propiciou conhecer um carro antes daquele que eu aprendia a dirigir, na autoescola. O que justifica a minha contestação ao instrutor que me perguntou se eu não iria parar o carro. Por que tenho de parar? E o instrutor: porque o carro à sua frente vai parar. Olhei assustada para ele e, em seguida para o carro e disparei: “Como o senhor sabe que ele vai parar?” E ele: “Não me diga que você não percebeu a luz de freio acesa?”
Como eu poderia perceber se não conhecia o funcionamento de um carro e ninguém me falou que ao pisar no freio, uma luz acende na traseira do carro. Que ideia genial, conclui. Mas fui reprovada assim mesmo, é claro! Passei somente na sétima tentativa, quando aceitei que o ato de dirigir é puramente mecânico, sem a necessidade de muitas inferências prévias.
Um dia de cada vez
Depois da carteira, eu era a escolhida para dirigir para minha mãe, sempre que ela não estava a fim de fazê-lo. Sei que dirijo bem mas percebi alguns aspectos que me exigiam muita atenção.
- Minha noção de tempo e espaço não era das melhores.
- Eu sentia extrema dificuldade com trajetos nunca feitos, mesmo com o GPS.
- O barulho infernal do trânsito, principalmente, buzina de motos me deixavam louca.
- As cidades têmmuita poluição visual e isso era motivo de estresse para mim.
- E ‘otras cositas más’.
Neurotípicos me julgarão e neurodivergentes me entenderão. Eu me esforçava e enfrentava até mesmo algumas viagens. Mas, geralmente, eu chegava ao meu destino, exaurida. Vomitava, tinha disenteria e alta irritabilidade. Deixei de dirigir em estradas, portanto.
Mas nunca é tarde. Nem mesmo para uma autista
Contudo, essa atitude me acarretou não viajar em minha lua de mel. Meu marido, à época, ainda não dirigia. Perdi batizados, casamentos, encontros, viagens… muita coisa boa da vida. Até que um dia…
Nunca é tarde. Nem mesmo para uma autista. Tinha um bom motivo para estar no Retiro do Chalé. Assim, me armei de coragem, estudei o caminho. Resolvi ir cedo, com o trânsito mais tranquilo. E maiores possibilidades de conseguir ajuda, caso eu precisasse. E não é que consegui? Eu mesma me dei nota 10. Contei minha vitória, depois de 30 anos de carteira para o porteiro e disse que ele também deveria me dar um 10. E ele deu com uma bela gargalhada.
Quer saber mais? Confira meu bate papo com @andressaantunesneuro no @neuropsicoterapiabh sobre o autismo na vida adulta:
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