1 de setembro de 2022

Tempo de Leitura: 4 minutos

Ekanda é uma associação que atende a população angolana mais vulnerável

Cerca de 7.100 quilômetros separam o Brasil de Angola, que fica no Oeste da África, também banhada pelo Atlântico. Com uma população de aproximadamente 15% da brasileira, o país africano tem o tamanho do estado do Pará. Se transpusermos a prevalência do último estudo oficial dos EUA (de 1 em 44), teríamos a estimativa de 750 mil autistas em Angola. Se ficarmos com os números conservadores da Organização Mundial da Saúde (OMS), o número seria de 330 mil autistas angolanos. Seja um ou outro, em todo lugar do mundo o autismo é uma questão relevante de saúde pública.

Muito parecido com o Brasil, o país também enfrenta grande desigualdade social e, como nós, muita dificuldade no diagnóstico e tratamento do autismo, principalmente por parte das famílias com menos poder aquisitivo. Mas, lá também tem muita gente preocupada com isso e fazendo algo para mudar essa realidade. Brasileiros e angolanos se uniram pela causa e criaram uma associação para promover um impacto social naquele país: a Ekanda.

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Brasil + Angola

Ekanda é uma associação que apoia pessoas com autismo e suas famílias, criada em 2017, cujo foco principal é a conscientização. Seu nome oficial é Associação Mundo Azul (AMA) de Apoio às Famílias e Crianças com Autismo. O nome fantasia, “Ekanda”, significa “nação” no idioma  kimbundu, uma das línguas nacionais de Angola. 

Luciana Costa, cofundadora e coordenadora da associação Ekanda, é mineira de Belo Horizonte, casada com um angolano, reside em Angola há 18 anos. Ela tem três filhas, sendo a caçula autista, a Gabriela,,hoje com 15 anos de idade, e que também tem deficiência intelectual. “Há quinze anos, não havia opções de atendimento aqui e não se falava das pessoas com deficiências, elas estavam ‘escondidas’ em casa, com uma grande dificuldade das famílias em aceitar o autismo. Hoje temos diversas clínicas particulares e vimos um grande aumento de discussões sobre o tema depois do congresso que tivemos aqui em Luanda”, contou Luciana.

Claudeci Euzebio de Oliveira Gago, outra cofundadora da Ekanda e simpatizante da causa, é uma espécie de “coringa” da associação, executando diversas funções. Também casada com um angolano, ela foi convidada pela sua comadre, a médica Inês Fortunato, que tem dois filhos autistas, e é outra cofundadora da Ekanda.

Ekanda é uma associação que apoia pessoas com autismo e suas famílias, criada em 2017, cujo foco principal é a conscientização. O nome oficial é Associação Mundo Azul (AMA) de Apoio às Famílias e Crianças com Autismo. O nome fantasia, “Ekanda”, significa “nação” no idioma kimbundu, uma das línguas nacionais de Angola. São três brasileiras na associação, além de Luciana e Claudeci, Sandra Freire é a terceira. Os demais são angolanos, além de Inês Fortunato, já citada, ainda temos: João Cardoso, Sandra Santos e Tatiana de Matos (atual presidente).

O início de uma jornada 

A Ekanda surgiu com a primeira conferência de autismo em Luanda, em 2017. “Foi uma grande conferência, com a participação de vários atores da sociedade, políticos, aí surgiu a Ekanda. Nossos objetivos são: primeiro, levar a informação sobre que é o autismo para a população; o segundo é a formação de educadores e pessoas ligadas à saúde — firmar parcerias com o Ministério da Educação, com o Ministério da Saúde para levar conhecimento também aos profissionais dessas áreas —; e o terceiro e último objetivo, seria, no futuro, criar um centro de neurodesenvolvimento em Luanda. Nossa associação atua em Luanda atualmente, mas tem permissão para atuar no país inteiro”, relembrou Claudeci.

Logo em seguida à conferência de 2017, a associação fez uma parceria com a Unicef — Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância — e promoveu um treinamento na província angolana de Bié.

Contra o bullying

No final de 2020, a associação atuou com 900 crianças no ensino público de Cassenda, subúrbio de Luanda, uma região de grande vulnerabilidade, levando educação contra o bullying, com foco no respeito às diferenças. A instituição também faz acolhimento e orientação às famílias, além de levar palestras a empresas e outras entidades para conscientizar sobre os sinais de autismo e a importância da intervenção precoce. “Ainda não temos uma sede, um espaço. Então, nosso trabalho hoje é atuar com as comunidades, buscando dar uma supervisão de profissionais para que eles consigam atuar com aquelas famílias”, contou Luciana.

Há dois anos, a psicóloga Beatriz da Cruz Felipe e a médica Inêz Fortunato fazem um trabalho de acompanhamento e orientação a famílias.

Neste ano, por meio de uma parceria com a igreja católica na Diocese de Viana, município vizinho a Luanda, com muita vulnerabilidade social, a Ekanda está iniciando um curso de formação para vinte profissionais de saúde e outros profissionais da comunidade local, entre eles,  freiras e professores.

Além desse trabalho, a instituição leva informação a centros maternos. “Ainda há muita fragilidade nas questões iniciais do autismo. Nós abordamos o diagnóstico e a intervenção precoces. Ou seja, na gestação, as habilidades esperadas, os sinais de alerta e possibilidades de estímulos dentro da realidade local. Não é o ideal, mas é pensando no que é possível fazer naquela comunidade”, explicou …..Quem?.

A realidade de Angola

Quase todo o atendimento existente é particular, acessível apenas à classe média. “Tem uma clínica famosa aqui, particular, que tem uma lista de espera de 150 famílias. O custo é muito elevado aqui. Minha filha, Gabriela, deveria estar contando com três terapias diferentes. Mas eu só consigo pagar uma!”, lamenta Luciana Costa.

Quem tem mais poder aquisitivo busca atendimento fora do país. Algumas famílias mudam-se para Portugal em busca de terapias. Muitas vezes, o pai fica em Angola, trabalhando para prover recursos financeiros e bancar o restante da família fora do país para o tratamento. O sistema de saúde pública de Angola é muito precário e ainda tem muitas demandas mais emergenciais que o autismo, como evitar a mortalidade infantil. “A prioridade é muito maior nas outras causas. Por exemplo, a malária recebe muito apoio, qualquer instituição que atua no combate da malária vai receber apoio do Ministério da Saúde e de outras empresas, porque é o que mais mata aqui e o que mais choca. São tantas deficiências [mais graves] que é preciso atuar antes… O autismo não é prioridade aqui”, relata Claudeci Gago.

Aproximadamente 40% dos 33 milhões de angolanos estão atualmente abaixo da linha de pobreza. Segundo a Unicef, cerca de 15% da população infantil sofre de subnutrição grave, a taxa de mortalidade infantil no país é de 44 mortes em cada 1.000 nascidos vivos. Cerca de 68 crianças em cada 1.000 morrem antes de completar os 5 anos de vida no país, que é o número 148 no ranking do IDH (índice de desenvolvimento humano) da ONU. No Brasil, a mortalidade infantil é de 13,1 por 1.000, também de acordo com a Unicef.

A Ekanda busca ajuda tanto financeira quanto com trabalho voluntário de profissionais a fim de expandir sua atuação e atender às demandas já existentes na comunidade. Para quem quiser fazer contato, o email da Ekanda é [email protected] e o site da associação é www.ekandaautista.com.

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Editor-chefe da Revista Autismo, jornalista, empreendedor.

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