31 de dezembro de 2022

Tempo de Leitura: 4 minutos

Acessibilidade para autistas: desenhos divertidos incorporados à vivência digital facilitam a comunicação, mas não para todos

Os emojis vieram para ficar mesmo. Como esses símbolos e desenhos facilitam a comunicação e economizam digitação no dia a dia de todo mundo, não é mesmo? Talvez não. Não para todo mundo! 

Os emojis foram uma criação japonesa, do final da década de 1990. O objetivo do primeiro conjunto, com 172 emojis, foi de facilitar a comunicação por meios eletrônicos. Daí em diante, virou uma febre no Japão e em poucos anos alastrou-se para o mundo todo, como vemos hoje em todos os celulares, aplicativos de mensagens e redes sociais.

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Há quem já esteja reclamando do uso excessivo e de quase uma “desalfabetização” das pessoas no ambiente online por conta de usar mais símbolos que palavras atualmente — quase voltamos à era dos hieróglifos egípcios. Mas não é bem esse o problema dos emojis a que me refiro aqui.

Compreender o significado dos emojis pode ser uma missão desafiadora para autistas

Algumas pessoas autistas podem se incomodar ou ter dificuldades ao interpretar os emojis. São dois grupos distintos dentro do espectro, mas deve também haver uma intersecção entre eles.

O primeiro abrange as pessoas que têm uma leitura muito literal e muito concreta (com dificuldade para entender figuras de linguagem, como ironia, duplo sentido, sarcasmo e alguns trocadilhos) e também quem não tem facilidade para “ler” as emoções faciais.

Se é difícil compreender a emoção expressada por uma face humana, imagine num “rosto” formado por uma bolinha amarela minúscula com uma ou duas “dicas visuais”, como um olho fechado ou uma boca aberta.

“Só entendo a cara sorrindo e a cara chorando, basicamente”, diz podcaster do Introvertendo

Esse assunto é destaque no episódio “O problema dos emojis” (de setembro de 2020), do podcast Introvertendo — feito somente por autistas —, o número 135, em que Paulo Alarcón, Thaís Mösken, Tiago Abreu e Willian Chimura levataram a questão: “Uma conversa pela internet já se tornou confusa demais pra você por causa de emojis?”.

Os podcasters relacionam este fenômeno da interação online com a dificuldade de autistas em reconhecerem o significado de expressões faciais e os contextos adequados para uso dessas “carinhas”.

Paulo Alarcón ainda conta o que originou essa pauta: “A ideia para esse episódio surgiu quando eu estava na integração da empresa onde eu trabalho, questionaram sobre a questão de emojis e eu citei minha dificuldade. Em seguida, no mesmo dia, minha noiva fez um teste comigo, me passando vários emojis aleatoriamente e pedindo pra eu dizer o que eles significavam. E aí eu percebi que eu não conseguia entender esses emojis. Eu só entendo a cara sorrindo e a cara chorando, basicamente.”

Hipersensibilidade: os símbolos podem atrapalhar a leitura, especialmente quando se movimentam

O segundo grupo é de autistas com hipersensibilidade visual ao ponto dos emojis atrapalharem a leitura. Não só os emojis, aliás. Há quem cubra com a mão parte da tela do celular ou do computador ao tentar ler um texto permeado por anúncios animados ou muitos emojis.

Alguns desses relatos podem ser ouvidos no episódio 116 do Introvertendo — “Acessibilidade na internet” (de julho de 2020).

“​​Como, por exemplo, ter um GIF (arquivo de imagem com uma animação curta) no meio de um texto prejudica e às vezes impossibilita pra mim a leitura do texto. É muito comum, se tem um alguma coisa piscando ou se mexendo, eu ter que colocar uma tela na frente daquilo ou colocar minha mão na frente da tela pra conseguir ler o conteúdo inteiro”, explicou Thaís Mösken, no podcast.

Fica claro, portanto, uma necessidade de adequação em algumas situações para pessoas dentro do espectro do autismo, principalmente no ambiente digital. Necessidades estas não só ignoradas pela sociedade até então, como também quase impossíveis de ganharem repercussão suficiente para serem notadas antes do aumento de casos de diagnósticos de adultos autistas, bem como a conscientização da sociedade para a urgente necessidade de que se dê voz aos autistas que têm condição de se expressar em qualquer nível.

Acessibilidade: rede social projetada para autistas permite desabilitar e “traduzir” emojis

Pensando nessa adequação, vi o local ideal para desenvolver um recurso de acessibilidade pensando para os autistas: a Tismoo.me (https://tismoo.me/), ​​primeira rede social do mundo dedicada ao autismo. À frente deste projeto, esta foi uma das primeiras coisas que expliquei ao time de programadores: faríamos um recurso que ninguém tinha, nem as grandes redes sociais e aplicativos!

Assim, desde a última versão do aplicativo Tismoo.me, há o primeiro recurso de acessibilidade para autistas. Com ele, é possível simplesmente desligar a exibição de emojis e todas as pessoas que se sentem desconfortáveis com essas “carinhas” se livram delas imediatamente.

Também é possível ligar a descrição de emojis, assim, mesmo com eles desligados, é possível saber o que as pessoas postaram, mas em texto. Por exemplo: um texto com “Oi! 😁”, passa a ser mostrado como “Oi! {emoji: rosto sorrindo}”.

Outra possibilidade é manter ligada a exibição dos emojis e também ligar a descrição, o que auxilia quem tem dúvida ao interpretar um emoji, pois poderá não só saber o significado de cada símbolo, como aprender o que cada um deles quer dizer.

Desta forma, os emojis passam a ser mostrados ao lado de sua descrição. Vamos a um exemplo. Um texto que originalmente seria assim: “Parabéns! 🎂❤️”, passa a ser exibido assim: “Parabéns! 🎂{emoji: bolo de aniversário}❤️{emoji: coração vermelho}”.

Prático, empático e simples de resolver, não acham?

 

PS: Ah! A rede Tismoo.me só aceita cadastros a convidados atualmente, então segue um convite pessoal meu para você, neste link (acesse pelo celular!). Espero que goste!😉{emoji: rosto piscando um olho}

 

(Publicado originalmente no blog da Autismo e Realidade, do Instituto PENSI, no artigo “Emojis e acessibilidade para pessoas com autismo – Autismo e Realidade,  por Francisco Paiva Jr.“, em 17.ago.2021)

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Editor-chefe da Revista Autismo, jornalista, empreendedor.

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