8 de abril de 2025

Tempo de Leitura: 5 minutos

O Brasil conta com um conjunto de leis que protegem e promovem a inclusão das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Desde o reconhecimento do autismo como deficiência até a cobertura de terapias pelos planos de saúde, essas normas são fundamentais para garantir a efetividade dos direitos das pessoas com TEA. A seguir, você encontrará um panorama geral das principais legislações federais relacionadas ao tema, além de algumas orientações que podem ajudar no dia a dia.

Lei Berenice Piana (Lei Federal nº 12.764/2012)

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Conhecida como “Lei Berenice Piana”, a Lei nº 12.764/2012 é considerada um marco para a proteção dos direitos das pessoas com TEA. Em seus dispositivos, há o reconhecimento oficial de que o autismo é uma forma de deficiência, o que assegura a esse público os mesmos direitos já previstos para outras deficiências.

A partir dessa lei, políticas de inclusão e acessibilidade passaram a ter mais respaldo legal nos setores de educação, trabalho e convivência social. Além de servir como base para outras normas e políticas públicas, a Lei Berenice Piana ressaltou a necessidade de compreender e atender as demandas específicas dos autistas de maneira individualizada e humanizada.

Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146/2015)

Chamada também de Estatuto da Pessoa com Deficiência, a Lei Brasileira de Inclusão (LBI) reconhece as barreiras que pessoas com TEA enfrentam em diferentes áreas sociais. No Artigo 2º, equipara os direitos das pessoas com autismo aos das demais pessoas com deficiência, assegurando proteção legal em pé de igualdade.

Nos Artigos 18, 23 e 24, a LBI determina que órgãos públicos e serviços de saúde ofereçam ações de prevenção, atendimento, habilitação e reabilitação, respeitando a dignidade e as necessidades de cada indivíduo. Já no ambiente educacional, o Artigo 28 proíbe que escolas (públicas ou privadas) cobrem taxas adicionais para fornecer recursos e adaptações para estudantes com TEA. E, no Artigo 51, há a garantia de que os planos de saúde não podem recusar ou limitar terapias necessárias.

A relevância desses artigos está em reforçar que muitos obstáculos enfrentados por quem tem TEA surgem das barreiras de acessibilidade impostas pela sociedade, não apenas do autismo em si. Por isso, conhecer esses direitos é fundamental para exigir respeito e buscar soluções sempre que houver recusa ou descumprimento. Caso alguém se depare com resistência, é indicado procurar a Defensoria Pública, um advogado especializado ou associações de apoio para fazer valer a lei.

Carteira de Identificação da Pessoa com TEA (Lei nº 13.977/2020 — Lei Romeo Mion)

Em 2020, a Lei Romeo Mion trouxe uma novidade importante: a criação da Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (CIPTEA). Embora não substitua documentos como RG ou CPF, a CIPTEA facilita a identificação em situações em que seja necessário comprovar o TEA, agilizando o acesso a serviços e garantindo que os direitos previstos na legislação sejam respeitados. Para obtê-la, é preciso verificar as regras e a forma de emissão junto aos órgãos estaduais ou municipais responsáveis.

Transporte público gratuito para autistas

Se a pessoa com TEA se enquadrar em determinados critérios de renda, pode obter o Passe Livre para viajar entre estados em transporte coletivo (ônibus, trem ou embarcação), conforme a Lei nº 8.899/1994. Para isso, basta se cadastrar no programa Passe Livre, apresentando documentos que comprovem a deficiência e a renda familiar.

Para deslocamentos dentro dos municípios ou entre cidades do mesmo estado, cada localidade segue suas próprias regras. Em algumas regiões, há leis municipais ou estaduais que garantem gratuidade ou descontos no transporte público. Por exemplo, em São Paulo, existem programas específicos que asseguram isenção ou tarifas reduzidas em ônibus municipais para pessoas com deficiência — e, em diversas outras cidades, há iniciativas semelhantes. Por isso, vale a pena consultar a legislação de onde você mora.

A Lei Brasileira de Inclusão também determina que a acessibilidade no transporte deve ser um direito fundamental, exigindo adaptações físicas e a remoção de barreiras. Entretanto, a gratuidade não é obrigatória em todo o país, ficando a cargo de cada estado e município criar políticas de isenção ou redução de tarifas.

Acesso ao mercado de trabalho: concursos e iniciativa Privada

No âmbito público, a Constituição Federal (art. 37, VIII) já determina reserva de vagas para pessoas com deficiência em concursos. A Lei nº 8.112/1990 prevê, de modo geral, até 20% do total de vagas para esse grupo, enquanto o Decreto nº 3.298/1999 estabelece como deve ser feita a inclusão durante as etapas de seleção, incluindo provas adaptadas.

Na iniciativa privada, a conhecida “Lei de Cotas” (Lei nº 8.213/1991) obriga empresas com 100 ou mais funcionários a destinarem de 2% a 5% de seus postos de trabalho a pessoas com deficiência ou reabilitadas, de acordo com o tamanho do quadro de colaboradores.

Se alguém se sentir discriminado ou encontrar barreiras injustificadas no processo seletivo — seja em concursos ou em empresas privadas — pode formalizar denúncia na ouvidoria do órgão, no RH da empresa ou buscar assistência jurídica junto a advogados, Defensorias Públicas ou mesmo ao Ministério Público do Trabalho.

Cobertura de tratamentos para pessoas com TEA nos planos de saúde

No Brasil, a Lei nº 9.656/1998 exige que os planos de saúde cubram doenças catalogadas na Classificação Internacional de Doenças (CID). Como o TEA está previsto na CID, os planos são obrigados a oferecer tratamentos como fonoaudiologia, psicologia, terapia ocupacional e Análise do Comportamento Aplicada (ABA), desde que prescritos por um profissional habilitado.

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) tem uma lista mínima de procedimentos e tratamentos que devem ser cobertos. Muitas decisões judiciais, contudo, vão além dessa lista quando há indicação clínica que justifique a necessidade de maior número de sessões ou abordagens mais específicas. Dessa forma, se um médico recomendar um número maior de sessões de terapia e o plano de saúde se recusar a cobrir, isso pode ser questionado legalmente.

Vale lembrar que, para medicamentos, as regras variam de acordo com o tipo de plano e as normas da ANS. Em casos de recusa, é importante verificar se a medicação ou terapia consta na lista obrigatória da ANS ou se há laudos médicos que justifiquem o tratamento. Caso o plano insista na negativa, recomenda-se buscar a ANS, o Procon, a Defensoria Pública ou um advogado para fazer valer esse direito.

Algumas palavras sobre habilitação e reabilitação

Os termos “habilitação” e “reabilitação” aparecem com frequência na legislação. Em linhas gerais, “habilitação” se refere àquelas ações destinadas a desenvolver habilidades que a pessoa ainda não adquiriu, enquanto “reabilitação” diz respeito a recuperá-las ou aprimorá-las depois de alguma perda ou limitação. No caso do TEA, esses conceitos geralmente envolvem sessões de terapia ocupacional, fonoaudiologia, psicopedagogia e outras intervenções que visam melhorar a qualidade de vida e a independência do indivíduo.

Exemplos de aplicação na prática

Para ilustrar, imagine uma família que, ao descobrir o diagnóstico de TEA em seu filho, precisa procurar uma escola particular. Se a instituição se recusar a matriculá-lo alegando falta de estrutura ou tentar cobrar valores adicionais para oferecer adaptações, tal atitude viola o que determina a Lei Brasileira de Inclusão. Nesse caso, a família pode formalizar a denúncia na Secretaria de Educação e, se necessário, recorrer à Defensoria Pública ou a um advogado.

Da mesma forma, se um plano de saúde limitar sessões de fonoaudiologia essenciais para o desenvolvimento da criança, mesmo havendo indicação médica clara, cabe buscar apoio nos órgãos de defesa do consumidor e, em último caso, na Justiça. Situações como essas têm sido cada vez mais reconhecidas pelos tribunais, que normalmente determinam a cobertura integral quando há prescrição profissional.

Conclusão

Além das leis federais mencionadas, muitas regiões do Brasil contam com legislações estaduais ou municipais que ampliam os direitos das pessoas com TEA, por exemplo, estendendo a gratuidade do transporte público ou oferecendo programas de apoio e atendimento especializado. Portanto, vale a pena pesquisar as normas do seu estado e município.

Em resumo, conhecer e exigir o cumprimento dessas leis é o caminho para garantir o pleno exercício de direitos fundamentais, como estudar em escolas inclusivas, obter cobertura adequada de planos de saúde e concorrer a vagas de trabalho em condições iguais às de qualquer outro candidato. Somente por meio de informação e do uso correto dos instrumentos legais, a inclusão das pessoas com TEA terá efeito prático na sociedade.

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Rodrigo Vitor Couto do Amaral é pai de autista e advogado formado pela PUC Goiás há mais de 20 anos.

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