1 de setembro de 2020

Tempo de Leitura: 2 minutos

“Amor no Espectro” é um delicioso reality show que retrata o autismo com bom humor e responsabilidade, além de conferir protagonismo às pessoas com essa condição. A série apresenta uma perspectiva quase completa dos relacionamentos entre autistas. O processo de flerte, as habilidades sociais, as questões de hiper ou hipossensibilidade sensorial, as expectativas individuais e familiares, as pressões sociais e visões sobre o amor, tudo isso é abordado na produção. A série é repleta de detalhes no que se refere à linguagem corporal, reciprocidade, coordenação motora, hiperfoco e diferenças culturais. Há até uma leve discussão sobre racismo e xenofobia. 

A série é uma grata surpresa da plataforma de streaming Netflix no que se refere a abordagem do tema. Afinal, se os meios de comunicação necessitam construir narrativas que tenham princípio, meio e fim bem delineados, a complexa rede de vivências que atravessa cada espectador pode abrir margem para uma série de percepções e questionamentos. Portanto, como cada autista é único, é sempre desafiador abordar as intrincadas nuances do espectro em seriados. Haverá sempre abertura para novas discussões e, mesmo que não seja totalmente diferente com esse caso específico, há significativos diferenciais.

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“Amor no Espectro” aproxima-se muito mais do que os pares fictícios (como “Atypical” e “The Good Doctor”) da “missão impossível” que é sintetizar a heterogeneidade da condição autista. Esse resultado é, em grande medida, reflexo do próprio conceito documental da série. O formato permite que sejam selecionados personagens de personalidades, etnias e orientações sexuais diversas, agindo como eles mesmos, às vezes com um desconforto natural das câmeras por perto. Isso permite uma boa noção do comportamento autista no cotidiano. 

Percebe-se o cuidado dos produtores também ao trazerem uma visão científica atualizada. Isso não se restringe à presença de especialistas, mas também diz respeito a debates que surgem de maneira natural, como o subdiagnóstico em mulheres autistas. Olivia, jovem atriz diagnosticada aos 18 anos de idade como autista, é a principal personagem a suscitar essa discussão. Ela se apresenta com um jeito alegre e aparentemente extrovertido que camufla todo um “nervosismo” vindo dos desafios de interação social. Ela se destaca em meio a personagens cujas dificuldades e habilidades são bastante distintas e ora óbvias, ora sutis. A história de Mark, jovem com hiperfoco em paleontologia, também merece uma menção especial. Embora ele seja na superfície alguém bastante educado e sociável, o contato mais próximo com sua trama revela muitas dificuldades de variar os interesses e  habilidades sociais.  

Algumas cenas mostram-se constrangedoras ou desconfortáveis, bem como o sentimento de frustração e dor contida, mas também há muita alegria no desenrolar dos capítulos. É certo que as relações amorosas são desafiadoras até para pessoas típicas. Entretanto, a série evidencia, sem estereótipos, o quanto uma rede de fatores, de naturezas diversas e por vezes quase imperceptíveis, tornam a busca e o envolvimento nesses relacionamentos ainda mais complexos para autistas.

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Jornalista, escritora, apresentadora, pesquisadora, 24 anos, diagnosticada autista aos 11, autora de oito livros, mantém o site O Mundo Autista no portal UAI e o canal do YouTube Mundo Autista.

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