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De uma maneira bem simples e resumida, vamos definir a comunicação aumentativa e alternativa (CAA) como todas as formas de comunicação (exceto a fala) que são usadas para expressar pensamentos, necessidades, desejos e ideias. A comunicação aumentativa dá suporte ou ajuda à fala (por exemplo: quando a fala é limitada ou ininteligível) e a alternativa substitui a fala (como quando a fala não está presente).
CAA inclui sistemas simples — tais como: imagens, fotos, figuras, gestos (como apontar), entre muitos outros — e dispositivos mais complexos que envolvem alta tecnologia, também chamados de vocalizadores.
Cerca de 25% a 35% das crianças com transtorno do espectro do autismo (TEA) não falam (1). Outros 25% a 30% das crianças com autismo falam algumas palavras aos 12 a 18 meses de idade e depois as perdem (2). Algumas crianças apresentam fala limitada (comparada a colegas da mesma idade), outras falam, mas não se comunicam (apenas repetem, usam ecolalia), algumas não usam a comunicação de forma espontânea (apenas respondem perguntas) e/ou usam uma fala ininteligível (apenas pessoas que convivem próximas a elas conseguem entender o que estão falando). Se o seu filho apresenta as dificuldades de comunicação citadas, ele irá se beneficiar da CAA.
O uso da CAA deve ser introduzido o mais rápido possível, para que ele possa comunicar suas necessidades, desejos e emoções de maneira clara e objetiva. “Assim como um piano sozinho não faz um pianista, nem uma cesta de basquete faz um atleta, um dispositivo CAA sozinho não faz um comunicador competente e proficiente” diz David Beukelman (3). Se você apenas comprar um aparelho de alta tecnologia e colocar na frente do seu filho ou aluno, não vai adiantar. Temos que ensiná-lo.
As pesquisas apontam que “em contraste com essas abordagens mais recentes e de alta tecnologia, abordagens de baixa tecnologia, como o protocolo PECS (sigla para Picture Exchange Communication System — em português: sistema de comunicação por troca de figuras), têm sido usadas extensivamente para estabelecer uma gama de comportamentos sociais e comunicativos considerados críticos para uma comunicação eficaz, funcional e robusta para indivíduos com autismo e outros transtornos de desenvolvimento relacionados” e “a literatura atual sobre CAA de alta tecnologia se beneficiaria da incorporação de componentes de abordagens de baixa tecnologia (ou seja, PECS), em vez de substituí-los completamente” (4).
Levando as pesquisas em consideração, sugiro que você ensine um protocolo baseado em evidências científicas: PECS para ensinar comunicação funcional. O protocolo do PECS enfatiza a ideia de que a comunicação é um processo interativo. Pelo menos duas pessoas são necessárias – um “falante” que transmite uma mensagem e um “ouvinte” ou parceiro comunicativo (PC) que recebe e responde à mensagem fornecendo um resultado social ou tangível. O falante deve entregar uma figura ou uma sequência de figuras à outra pessoa (PC), garantindo assim a abordagem social e a interação. Cada uma das 6 fases do protocolo ensina um aspecto diferente da comunicação. Começando usando figuras únicas para comunicar suas necessidades, depois reconhecendo e escolhendo entre uma variedade de figuras para construir frases cada vez mais complexas. Comentar, responder e fazer perguntas simples também são ensinados para expandir e construir a comunicação.
A transição
Quando o seu filho/aluno demonstrar a iniciação/ espontaneidade, for até a outra pessoa (PC) para poder comunicar estando ela próxima ou distante, souber o que as figuras representam (discriminação de figuras) e formar frases simples (ex: Eu quero ___): ele será um excelente candidato à transição para uma alta tecnologia (dispositivo gerador de fala). Ou seja, ele deve ter dominado as fases 1, 2, 3 e 4 do protocolo do PECS, utilizar um vocabulário grande e categorizado e também possuir uma estrutura frasal.
“O protocolo PECS demonstrou ter aplicação universal para a introdução e uso de alta tecnologia. Esse benefício pode ser aprimorado quando são escolhidos dispositivos que correspondam às habilidades de comunicação atuais do aluno no PECS e que permitam o crescimento contínuo da comunicação.”, segundo Frost e McGowan (5)
O profissional responsável deve fazer uma avaliação cuidadosa e, quando possível, uma testagem com os possíveis dispositivos de alta tecnologia para selecionar um deles que permita manter todas as habilidades que o seu filho ou aluno já apresenta: como o acesso independente, a iniciação, as interações sociais, a estrutura e o comprimento das frases em diferentes ambientes. Além de permitir espaço para crescimento da linguagem e aprendizado de mais habilidades.
Em alguns casos, a transição para a alta tecnologia não é necessária. Estes casos acontecem principalmente com crianças pequenas com autismo quando a fala emerge e eles fazem a transição para a nova modalidade da comunicação: a fala.
Independente da fala emergir ou não no caso do seu filho ou aluno: ENSINE comunicação funcional para ele e você estará proporcionando a ele uma melhor qualidade de vida e certamente dando-lhe maior independência.
Referências
1 – Brignell, A., Chenausky, K. V., Song, H., Zhu, J., Suo, C. and Morgan, A. T.. (2018). Communication interventions for autism spectrum disorder in minimally verbal children. Cochrane Database of Systematic Reviews. 2018(11), p. CD012324. Disponível em: https://doi.org/10.1002/14651858.CD012324.pub2
2 – Johnson, C.P. Early Clinical Characteristics of Children with Autism. In: Gupta, V.B. ed: Autistic Spectrum Disorders in Children. New York: Marcel Dekker, Inc., 2004:85-123. doi:10.1201/9780203026229.ch5. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/307943767_Early_Clinical_Characteristics_of_Children_with_Autism
3 – Beukelman, D. (1991). Magic and cost of communicative competence. Augmentative and Alternative Communication, 7, 2‒10. doi: 10.1080/07434619112331275633. Disponível em: https://psycnet.apa.org/record/1991-28605-001
4 – Gilroy, McCleery & Leader, (2017). Systematic review of methods for teaching social and communicative behavior with high-tech augmentative and alternative communication modalities. Review Journal of Autism and Developmental Disorders 4 (4), 307-320. Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1007/s40489-017-0115-3
5 – Frost, L. and McGowan, J. (2011) Strategies for Transitioning From PECS to SGD. Part I: Overview and Device Selection. Perspectives on Augmentative and Alternative Communication. doi: 10.1044/aac20.4.11. Disponível em: https://pubs.asha.org/doi/10.1044/aac20.4.114