4 de julho de 2023

Tempo de Leitura: 3 minutos

Verifica-se que cada vez mais as diversas instâncias do judiciário brasileiro vem se tornando mais sensíveis às questões relacionadas ao autismo. Nesse caso em específico, o direito pleiteado era a redução de carga horária de servidor público lotado no Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) perante o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que é o órgão da administração judiciária responsável por aperfeiçoar o trabalho da justiça nacional, principalmente no que diz respeito ao controle e à transparência administrativa e processual.

Dessa vez, o conselheiro Marcello Terto, relator do Procedimento de Controle Administrativo (PCA) nº 0005797-15.2022.2.00.0000, julgou procedente o procedimento movido por um oficial de justiça, que é pai de autista, e pleiteava a redução de carga horária, sem redução de vencimentos e sem a necessidade de compensação de horas. Inicialmente o pleito previa a possibilidade do teletrabalho (home office) ou a redução do número de mandados judiciais a ser encaminhado para o servidor. Ao final do procedimento, o CNJ concedeu o regime de redução de carga horária, reconhecendo a necessidade de acompanhamento paterno nas questões que envolvem seu filho autista.

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Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido, confirmando a liminar do Id 4914916, de modo que, independentemente de compensação e sem comprometimento da remuneração, seja concedido regime especial de trabalho ao requerente, mediante a redução da distribuição de mandados a ele distribuídos em proporção equivalente à metade do que recebem os demais oficiais de justiça, mantida essa relação até que o TJPE realize avaliação de perícia técnica ou de equipe multidisciplinar que justifique o aumento proporcional da carga de trabalho para além do mínimo legal de 4 (quatro) horas diárias ou 20 (vinte) horas semanais, ou o restabelecimento do regime normal de trabalho, desde que, em qualquer hipótese, não se comprometam as condições dignas de existência da criança com necessidades especiais ou do seu núcleo familiar.

Fonte: Procedimento de Controle Administrativo (PCA) nº 0005797-15.2022.2.00.0000 CNJ.

Além disso, o conselheiro fez menção direta a outros julgados, um deles do conselheiro Mário Goulart Maia, quem em outra situação similar, também se posicionou favoravelmente e redução de carga-horária para servidor público pai de autista, em razão da sua natureza indivisível e titularidade de pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato individual e social (transindividualidade).

O conselheiro Mario Maia é um defensor da causa autista com notável atuação junto ao CNJ, tendo no ano de 2023 lançado uma cartilha sobre os direitos dos autistas pelo próprio CNJ, em uma atuação pioneira no órgão.

 

CONSELHEIRO MARCELLO TERTO E SILVA

Autos: Procedimento de Controle Administrativo nº 0005797-15.2022.2.00.0000

Requerente: (nome suprimido)

Requerido: Tribunal de Justiça do Estado do Pernambuco (TJPE)

EMENTA: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. OFICIAL DE JUSTIÇA DO TJPE. FILHO COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. RESOLUÇÃO Nº 343/2020. REGIME ESPECIAL DE TRABALHO MEDIANTE REDUÇÃO DO NÚMERO DE MANDADOS DISTRIBUÍDOS. COMPATIBILIDADE. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.

1. O cerne da controvérsia reside em saber se o meirinho faz jus ou não ao exercício da atividade em regime especial de teletrabalho (home office) ou redução de jornada de trabalho, na forma de redução do número de mandados distribuídos.

2. Interesse ou direito que, embora materializado no caso concreto, estende-se, conforme reconhecido pelo Conselheiro Mário Goulart Maia, no PCA nº 0005447-27.2022.2.00.0000, a outras hipóteses difusas, em razão da sua natureza indivisível e titularidade de pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato individual e social (transindividualidade).

3. Nos termos do artigo 2º, III, da Resolução nº 343/2020, é possível definir horário especial ao servidor cujo filho é portador Transtorno do Espectro do Autismo (TEA).

4. Interpretação sistemática da política pública mediante a qual se oferece condições de efetivação do direito social ao desenvolvimento sadio, harmonioso e em condições dignas de existência da criança portadora de deficiência a quem se dirige toda a política afirmativa de inclusão social (Lei nº 8.069/1990, art. 7º).

5. O tratamento da criança portadora de TEA é obviamente permanente e a presença dos pais é fundamental, especialmente quando se conectam com os profissionais responsáveis, estabelecem diálogo positivo para entender melhor o que acontece com o filho e aprendem a lidar com sintomas da síndrome, dificuldades do tratamento e adaptações necessárias à rotina da família.

6. Cuidando-se de oficial de justiça que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência, necessidades especiais ou doença grave, a diminuição de horário de trabalho se traduz em redução do número de mandados distribuídos, de modo a que a carga de trabalho permita maior dedicação ao dependente. “Se faz jus à redução de quatro horas de trabalho, basta que tenha distribuída carga correspondente à metade do que recebem os seus colegas”(TRF4, Processo SEI nº 0004043-82.2017.4.04.8003).

7. Concessão de regime especial de trabalho ao requerente, mediante a redução da distribuição de mandados, mantida essa relação até que o tribunal realize avaliação de perícia técnica ou de equipe multidisciplinar que justifique o aumento proporcional da carga de trabalho para além do mínimo legal de 4 (quatro) horas diárias ou 20 (vinte) horas semanais, ou o restabelecimento do regime normal de trabalho, desde que, em qualquer hipótese, não se comprometam as condições dignas de existência da criança com necessidades especiais ou do seu núcleo familiar.

8. Procedência do pedido.

Fonte: Revista CNJ, v. 7, n.1, jan-jun., 2023.

 

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Advogado, educador, professor e ativista. Mestrando em Direito, LLM em direito corporativo, pós graduação em direito do consumidor, civil e processo. Fundador da LigaTEA – Advogados que Defendem Autistas. Licenciatura em letras-português, consultor educacional, pós graduação em docência e metodologia da pesquisa científica, pós graduação em informática educativa, pós graduação em neuroeducação e pós-graduando em análise comportamental aplicada ao autismo. Pai do Benjamin (autista 9 anos).

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