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Estudos demonstram que pessoas com autismo geralmente apresentam déficits nas funções executivas, como dificuldades em se concentrar, planejar, organizar tarefas, lidar com mudanças, tomar decisões e controlar impulsos. Esses déficits podem afetar a capacidade dos autistas de executar atividades simples como: organizar o quarto, fazer sua própria refeição, tomar banho e até mesmo regular-se, de modo a lidar com o cotidiano, adaptar-se a novas situações e interagir socialmente de forma adequada.
Diversas são as estratégias que podem ser utilizadas para trabalhar as funções executivas em pessoas com autismo e auxiliá-las em seu desenvolvimento. Vamos deixar algumas sugestões que podem ser aplicadas:
- A inibição de resposta é a capacidade de planejar antes de agir, assim, resistir ao impulso de falar ou fazer algo antes de avaliar a situação e consequentemente prever qual o impacto do seu comportamento nela. Para estimular essa habilidade, é importante ensinar à pessoa com autismo alguns repertórios, como aprender a esperar, aprender a ter controle inibitório motor e vocal, escutar antes de falar e controlar sua ansiedade. Um ponto importante para o ensino dessas habilidades é explicar e mostrar antecipadamente o que você espera da pessoa naquela situação. Para facilitar, pode-se fazer uso de recursos visuais com regras antes da atividade. É possível utilizar cartões de espera com gratificações, como também usar recursos visuais de autocontrole.
- A memória operacional é a capacidade de reter informações por um curto período de tempo enquanto se realiza outras tarefas. Também inclui a capacidade de contar com o aprendizado ou uma experiência anterior para lidar com uma situação presente ou projetá-la no futuro. Para facilitar esta habilidade, é importante ensinar alguns repertórios, como dar um recado para alguém, fazer um lembrete, pedir para que a pessoa relate o que vivenciou em uma atividade anterior —”Como foi a aula?”, “O que tinha na sala de laboratório?” — e realizar atividades em que ela precise guardar informações para poder executar, por exemplo, numa atividade de lógica em matemática, quando é preciso reter a informação do cabeçalho do problema para executar a operação matemática.
- O treino de controle emocional é muito importante para as pessoas com autismo, é possível estimular a aprendizagem de como regular suas emoções para alcançar determinadas metas, completar tarefas, controlar e direcionar o próprio comportamento e lidar com sensações desagradáveis, como ansiedade, frustração, decepção e raiva. Algumas estratégias são: ensinar a fazer combinados e acordos; ensinar o reconhecimento de suas próprias emoções com cartões, figuras e jogos; utilizar roteiros de como se auto regular em situações problemáticas e utilizar roteiros de como controlar o comportamento em público.
- A atenção sustentada é outra habilidade essencial para que a pessoa consiga focar em uma situação ou tarefa, apesar de distrações externas e internas. Por exemplo: em uma conversa entre amigos, em um local público, ela precisa ter a capacidade de inibir estímulos externos como barulho, pessoas passando, luzes, e internos como: a fome, o frio e uma possível dor. Alguns recursos que podem ser utilizados são: tornar as atividades interessantes, reduzir tarefas complexas em partes menores, usar sistema de incentivos para que a pessoa finalize a tarefa e usar recursos que sinalizem o tempo necessário para execução.
- Trabalhar a inicialização de tarefas e planejamento/priorização é fundamental para a capacidade de iniciar projetos ou atividades sem adiamentos indevidos, sem procrastinação e de maneira eficiente. Alguns dos recursos possíveis é ter uma rotina bem elaborada, utilizar estímulos visuais e auditivos como um painel de rotina e alarmes de relógio. Outro recurso é utilizar uma lista com as etapas necessárias para finalizar uma tarefa. Por exemplo, para lavar a louça, é necessário: jogar o excesso de comida fora, empilhar os pratos, separar os talheres e copos, ligar a torneira, molhar um utensílio por vez, desligar torneira, passar o detergente na esponja, esfregar, enxaguar o item e colocá-lo no escorredor de pratos.
- A organização é a capacidade de manter um sistema de arrumar e localizar objetos importantes. O ensino da organização deve ser feito desde os primeiros anos de idade, desenvolvendo repertórios como: organizar brinquedos, colocar roupa suja no balde, organizar a mochila, entre outros. Alguns recursos utilizados são: ter uma imagem visual do quarto organizado, para que quando a criança brinque, ela saiba o que é esperado após a brincadeira. Outra estratégia é sinalizar, com etiqueta, caixas coloridas, o local de cada categoria de itens, por exemplo, ter uma figura de uma cueca na frente da gaveta em que ele deve guardá-la.
- O gerenciamento de tempo é a capacidade de identificar o tempo disponível que se tem para executar algo e como permanecer dentro dos limites desse tempo e de prazos. Para ensinar a gerenciar o tempo, é recomendado o uso de ampulhetas e relógios, para que a tarefa seja realizada dentro de um tempo específico e calendários, agendas e planilhas para organização de prazos, do seu tempo na semana, mês e até ano.
- Também é importante estimular o controle e a regulação da flexibilidade cognitiva, pois essa é a capacidade de se adaptar ao ambiente, ajustar os planos diante de obstáculos, mudanças, imprevistos, novas informações ou erros que podem acontecer no dia a dia. Para estimular a flexibilidade, podem-se inserir mudanças gradativamente para a pessoa, avisando com antecedência tal mudança, mostrando um roteiro do que pode ser feito em casos de imprevistos, ensinando-a a desenvolver estratégias para lidar com as situações novas.
Portanto, estimular essas melhorias das funções executivas em crianças, jovens e adultos com transtorno do espectro do autismo é algo indispensável. O processo de neuroplasticidade acontece a todo momento quando se é estimulado, em qualquer ambiente ou situação, o que leva a aumentar as conexões cerebrais essenciais para a aprendizagem. Sendo assim, se você é mãe ou pai, é importante entender as estratégias necessárias e saber como aplicá-las no dia a dia, para garantir o melhor desenvolvimento cognitivo e comportamental dos autistas.
Luana Passos é psicóloga, especialista em neurociências aplicadas e diretora da Clínica Somar . Igor Tchaikovsky é PhD em neurociências. Ambos integram a Clínica Somar e a Somar Neuro.