23 de agosto de 2023

Tempo de Leitura: 3 minutos

Hoje eu quero falar sobre a hiperempatia no autismo. É que já produzimos conteúdo sobre os mitos e verdades acerca da empatia em autistas. Portanto, a gente sabe que pessoas autistas são vítimas da falsa crença de que elas não têm empatia. Mas, verdade seja dita, a empatia é um conceito complexo. Isso porque ele envolve vários aspectos, o que inclui a empatia emocional, que é aquele sentimento que a dor do outro provoca em nós. Essa ideia de empatia está preservada em autistas.

Também, há a noção de empatia cognitiva, que se refere à capacidade de imaginar situações que o outro possa estar vivendo. Então, ela está ligada à Teoria da Mente. Ou seja, tem a ver com as inferências que fazemos ao imaginar como o outro pode estar se sentindo. Essa percepção costuma ser mais comprometida e alterada em pessoas autistas.

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Empatia no autismo é um conceito complexo

Assim, confesso que desde que a minha mãe obteve o diagnóstico dela em 2016, eu me lembro que comecei a refletir mais profundamente sobre esse tema da hiperempatia. Afinal, já naquela época eu me identificava como hiperempata. Isso porque eu manifestava uma empatia emocional mais aflorada. Porém, com o diagnóstico de mamãe, a gente percebeu que ela é ainda mais hiperempata do que eu.

Dessa forma, caiu por terra para nós essa ideia de que autistas têm pouca ou nenhuma empatia. Na realidade, a gente sente do outro e vai se movimentar muito para ajudá-lo. E isso pode até esbarrar em uma falta de empatia cognitiva. Ou seja, em uma carência da percepção do outro. Em outras palavras, você quer tanto ajudar a pessoa, que não consegue visualizar a perspectiva dela. Assim, não nota que a outra pessoa pode não estar sofrendo tanto em uma situação como você estaria, por exemplo.

Como a hiperempatia no autismo vem transformando as pesquisas?

Fato é que os relatos recorrentes de autistas com hiperempatia vem provocando pesquisadores a entenderem melhor esse conceito. Isso porque a gente se emociona muito. Eu, por exemplo, choro com filmes em que muitas vezes as outras pessoas não veem nada que consideram profundo. Mas, algo ali me toca e eu choro e sofro de ficar com o coração partido.

Um exemplo está no remake em live-action de “A Pequena Sereia” (2023), da Disney. Neste filme, há uma citação do conto original do Hans Christian Andersen que fala assim: “As sereias não têm lágrimas. Por isso, elas sofrem muito mais”. Então, só de lembrar disso já me dá vontade de chorar. Isso porque eu fico realmente tocada. Afinal, eu consigo entender a percepção de alguém que tem que conter tanto os próprios sentimentos para se adequar e acaba tendo que guardá-los dentro de si. E ninguém vê essa dor enorme. Então, toda essa reflexão me provoca um intenso desconforto.

Mais exemplos de hiperempatia no autismo

Ainda sobre “A Pequena Sereia”, eu me lembro de uma vez em que fui ao teatro com minha mãe quando eu era criança. Então, nós assistimos a uma versão musical do conto. E minha mãe era amiga da protagonista, a atriz que interpretava a Ariel. Ela nos convidou para ir aos bastidores. Porém, minha mãe não deu conta em função de uma crise de choro ao final do espetáculo. Isso porque, no teatro, o desfecho do enredo era trágico. Afinal, a Ariel não conseguia concretizar o objetivo de ficar com o príncipe. Com isso, acabava tendo um destino mais triste que a morte. Na verdade, acredito que minha mãe via algo da minha própria trajetória ali.

Um outro exemplo é o filme “A Noiva Cadáver” (2005), do cineasta Tim Burton. Isso porque nós fomos ao cinema ver essa animação infantil e, embora as crianças saíssem da sessão leves e alegres, minha mãe teve uma crise de choro. Também, lembro-me que ficava muito tocada vendo a Anjelica, da série em desenho animado dos anos 1990, “Rugrats: Os Anjinhos”. É que, apesar de ela ser a vilã, eu me solidarizava com o sofrimento implícito da personagem. Isso porque os pais não davam atenção a ela.

Enfim, pessoas autistas podem de fato manifestar uma emoção muito forte frente a dor do outro. Inclusive, elas podem querer ajudar e às vezes não conseguir, o que vai alimentar um ciclo difícil. Além disso, alguma situação pode nos tocar tão profundamente que a gente pode nem perceber qual foi o gatilho.

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Jornalista, escritora, apresentadora, pesquisadora, 24 anos, diagnosticada autista aos 11, autora de oito livros, mantém o site O Mundo Autista no portal UAI e o canal do YouTube Mundo Autista.

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