1 de setembro de 2019

Tempo de Leitura: 4 minutos

O decreto-lei 54/2018 assinala no seu preâmbulo que tem como eixo central de orientação “a necessidade de cada escola reconhecer a mais-valia da diversidade dos seus alunos, encontrando formas de lidar com essa diferença, adequando os processos de ensino às características e condições individuais de cada aluno, mobilizando os meios de que dispõe para que todos aprendam e participem na vida da comunidade educativa.” 

Pretende assim dar mais autonomia às escolas e aos seus profissionais, e, deste modo, criar condições para que estas definam o processo de identificação das barreiras à aprendizagem com que o aluno se confronta, apostando na “diversidade de estratégias para as ultrapassar”. O objetivo final é assegurar que cada aluno tenha acesso a um currículo e a uma aprendizagem que o leve ao limite das suas potencialidades.

Publicidade
Genioo

Para tal, consagra-se uma abordagem baseada em “modelos curriculares flexíveis, no acompanhamento e monitorização sistemáticas da eficácia do contínuo das intervenções implementadas, no diálogo dos docentes com os pais ou encarregados de educação e na opção por medidas de apoio à aprendizagem, organizadas em diferentes níveis de intervenção”. 

Assim, são estabelecidas medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão em três níveis de intervenção: universais, seletivas e adicionais.

As medidas universais – respostas educativas que a escola tem disponíveis para TODOS os alunos com objetivo de promover a participação e a melhoria das aprendizagens – que são: 

  1. A diferenciação pedagógica;
  2. As acomodações curriculares;
  3. O enriquecimento curricular;
  4. A promoção do comportamento pró-social; 
  5. A intervenção com foco académico ou comportamental em pequenos grupos.

As medidas seletivas são “ativadas” quando as medidas universais não colmatam as necessidades de suporte à aprendizagem do aluno. São elas: 

  1. Os percursos curriculares diferenciados;
  2. As adaptações curriculares não significativas;
  3. O apoio psicopedagógico;
  4. A antecipação e o reforço das aprendizagens, e; 
  5. O apoio tutorial.

Quando as medidas universais e seletivas são insuficientes para colmatar as necessidades de suporte à aprendizagem do aluno, nomeadamente dificuldades acentuadas e persistentes ao nível da comunicação, interação, cognição ou aprendizagem, então podem ser tomadas medidas adicionais. São elas: 

  1. A frequência do ano de escolaridade por disciplinas; 
  2. As adaptações curriculares significativas;
  3. O plano individual de transição;
  4. O desenvolvimento de metodologias e estratégias de ensino estruturado, e;
  5. O desenvolvimento de competências de autonomia pessoal e social.

Este novo diploma da “educação inclusiva”, vem criar duas estruturas no organograma das Escolas: 

1- A “Equipa multidisciplinar de apoio à educação inclusiva”, que tem como competências:

– Sensibilizar a comunidade educativa para a educação inclusiva;

– Propor as medidas de suporte à aprendizagem a mobilizar;

– Acompanhar e monitorizar a aplicação de medidas de suporte à aprendizagem;

– Prestar aconselhamento aos docentes na implementação de práticas pedagógicas inclusivas;

– Elaborar o relatório técnico-pedagógico, o programa educativo individual e o plano individual de transição previstos;

– Acompanhar o funcionamento do centro de apoio à aprendizagem.

  1. O “Centro de apoio à aprendizagem” (CAA), que será sediado nas escolas que já possuem as unidades de apoio especializado, tem como:
  2. a) Objetivos gerais:

– Apoiar a inclusão das crianças e jovens no grupo/turma e nas rotinas e atividades da escola, designadamente através da diversificação de estratégias de acesso ao currículo;

– Promover e apoiar o acesso à formação, ao ensino superior e à integração na vida pós-escolar;

– Promover e apoiar o acesso ao lazer, à participação social e à vida autónoma.

  1. b) Objetivos específicos:

– Promover a qualidade da participação dos alunos nas atividades da turma a que pertencem e nos demais contextos de aprendizagem;

– Apoiar os docentes do grupo ou turma a que os alunos pertencem;

– Apoiar a criação de recursos de aprendizagem e instrumentos de avaliação para as diversas componentes do currículo;

– Desenvolver metodologias de intervenção interdisciplinares que facilitem os processos de aprendizagem, de autonomia e de adaptação ao contexto escolar;

– Promover a criação de ambientes estruturados, ricos em comunicação e interação, fomentadores da aprendizagem;

– Apoiar a organização do processo de transição para a vida pós-escolar.

Tal como no anterior diploma, é prevista, para os alunos que tenham um Programa Educativo Individual, a complementação deste com um Plano Individual de Transição, a ter início nos “três anos antes da idade limite da escolaridade obrigatória” (18 anos) e que promova a transição para o pós-escola, sempre que possível para o desenvolvimento de uma atividade profissional.

Conclusões

Este diploma estabelece uma nova abordagem da problemática das dificuldades de aprendizagem das crianças e dos alunos, mais exigente para as escolas e para os seus profissionais, docentes e não docentes, uma vez que será privilegiada a implementação das medidas, nomeadamente as “adicionais”, em contexto de sala de aula.

A maior crítica ao diploma é a não previsão de um dispositivo ou plano de formação para o pessoal docente e não docente que acompanhará a aplicação, sobretudo das “medidas adicionais”.

Existiram logo à partida muitos constrangimentos à implementação deste diploma, e, para os casos mais severos, as respostas continuam a não ser adequadas ou não existem mesmo. 

A autonomia escolar consagrada no diploma, não era, e não é real, pois em muitos casos teria de ser acompanhada por mais recursos humanos e financeiros. A título de exemplo, estão estabelecidos rácios (indicadores sobre desempenho)

de pessoal não docente afetos ao “ensino especial” assente numa lógica matemática que não discrimina de forma positiva a existência de casos severos que necessitam de uma relação de trabalho unitária. Por outro lado, fazem falta atividades fora da escola de inclusão social.

Mas o maior problema será para os casos mais severos com o término da escola pós 18 anos.

O Plano Individual de Transição, com raríssimas exceções, já não era executado no anterior diploma, e o mais certo é continuar a não funcionar neste diploma, o que vai implicar que neste ano de 2019 algumas centenas de jovens com autismo vão sair da rede escolar sem que tenham alguma resposta alternativa.   

Por outro lado, a grande maioria das famílias acomodam-se à resposta escolar e não trabalham dentro do tempo necessário para um futuro para os seus filhos.

Assim, todo o trabalho e esforço de uma inclusão escolar não vai ser consequente. Após o término escolar poderá resultar numa exclusão social, com a restrição dos jovens a suas próprias casas.

COMPARTILHAR:

Economista, tem 3 filhos neurotípicos, foi diretor da APPDA Norte (Associação Portuguesa para as Perturbações do Desenvolvimento e Autismo) de 2000 a 2009, fundador e atual presidente da direção da AIA (Associação para a Inclusão e Apoio ao Autista) desde 2010, criador e gestor da página Facebook “Autismo Portugal”.

Social e sensorial

Vantagens da neurodiversidade e direitos humanos

Publicidade
Assine a Revista Autismo
Assine a nossa Newsletter grátis
Clique aqui se você tem DISLEXIA (saiba mais aqui)