7 de abril de 2023

Tempo de Leitura: 4 minutos

A terceira turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu em 21.mar.2023 que os planos de saúde são obrigados a cobrir a musicoterapia para os beneficiários autistas que tenham prescrição médica.

O julgamento do Recurso Especial, REsp 2.043.003-SP, sob a relatoria da Ministra Nancy Andrighi, entendeu que:

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Até 1/7/2022, data da vigência da Resolução Normativa n. 539/2022 da ANS, é devido o reembolso integral de tratamento multidisciplinar para beneficiário portador de transtorno do espectro autista realizado fora da rede credenciada, inclusive às sessões de musicoterapia, na hipótese de inobservância de prestação assumida no contrato ou se ficar demonstrado o descumprimento de ordem judicial (Informativo nº 769 de 4 de abril de 2023).

O julgamento entendeu ser abusiva a conduta do plano de saúde em limitar ou recusar a cobertura de sessões de musicoterapia para pessoas dentro do espectro autista.

Importante destacar que a Resolução Normativa n. 539/2022 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) definiu que as terapias específicas quando prescritas por médico especialista em laudos que atestam o diagnóstico do TEA, devem ser cobertos pelos planos de saúde, e dentre elas a musicoterapia é uma das terapias que possuem evidências científicas robustas em toda a literatura médica e especializada.

No Brasil a Musicoterapia ainda não é uma profissão regulamentada por lei, mesmo havendo projeto de lei tramitando no congresso nacional para tal finalidade. Atualmente a União Brasileiras das Associações de Musicoterapia (UBAM) está à frente das lutas por garantias mínimas de trabalho aos musicoterapeutas, incluindo as articulações políticas junto ao congresso nacional para a regulamentação da profissão. Para garantia de um serviço que prese pela qualidade técnica, a UBAM possui critérios técnicos e científicos para um profissional manejar a musicoterapia como prescreve a ciência.

Mesmo não sendo um órgão de classe, a UBAM possuem representatividade nacional, tendo surgido em 1996, com a criação do seu CNPJ em 2015, fazendo com que seja a instituição mais antiga na defesa dos musicoterapeutas e dos pacientes, para que tenham a segurança de contratar um profissional que tenham conhecimentos técnicos para tratar autistas.

Existem cursos de graduação e pós-graduação em musicoterapia, que habilitam os especialistas a tratarem pacientes por meio da técnica terapêutica, que não se confunde com aulas de música ou musicalização, haja vista ser uma ciência autônoma e uma profissão que necessita de conhecimentos específicos para ser manejada. Não a toa que a musicoeterapia faz parte da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde (SUS) e possui um Código Brasileiro de Ocupação (CBO) pelo ministério da saúde.

Nesse contexto o STJ fez essa ressalva informativo 79 de 04.abr.2023:

A musicoterapia foi incluída à Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde, que visa à prevenção de agravos e à promoção e recuperação da saúde, com ênfase na atenção básica, voltada para o cuidado continuado, humanizado e integral em saúde (Portaria n. 849, de 27 de março de 2017, do Ministério da Saúde), sendo de cobertura obrigatória no tratamento multidisciplinar, prescrito pelo médico assistente e realizado por profissional de saúde especializado para tanto, do beneficiário portador de transtorno do espectro autista (Informativo nº 769 de 4 de abril de 2023).

Em suma, se houve prescrição médica em laudo é possível que o plano seja obrigado ao custeio da musicoterapia para autistas.

Não custa lembrar que o profissional para ser musicoterapeuta não precisa passar por uma graduação na área de saúde, ele precisa ter graduação ou pós-graduação em musicoterapia, fazendo uma interpretação extensiva da lei 14.454/2022 que garantiu que o rol de cobertura da ANS seja exemplificativo.

 

Ementa do acórdão

PROCESSO
REsp 2043003 / SP
RECURSO ESPECIAL
2022/0386675-0
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA. PLANO DE SAÚDE. NATUREZA TAXATIVA, EM REGRA, DO ROL DA ANS. TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR PRESCRITO PARA BENEFICIÁRIO PORTADOR DE TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. MUSICOTERAPIA. COBERTURA OBRIGATÓRIA. REEMBOLSO INTEGRAL. EXCEPCIONALIDADE.

1. Ação de obrigação de fazer, ajuizada em 23/10/2020, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 06/04/2022 e concluso ao gabinete em 15/12/2022.
2. O propósito recursal é decidir sobre: (i) a negativa de prestação jurisdicional; (ii) a obrigação de a operadora do plano de saúde cobrir as terapias multidisciplinares prescritas para usuário com transtorno do espectro autista, incluindo a musicoterapia; e (iii) a obrigação de reembolso integral das despesas assumidas pelo beneficiário com o custeio do tratamento realizado fora da rede credenciada.
3. Devidamente analisadas e discutidas as questões de mérito, e suficientemente fundamentado o acórdão recorrido, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há falar em violação do art. 1.022, II, do CPC/15.
4. Embora fixando a tese quanto à taxatividade, em regra, do rol de procedimentos e eventos em saúde da ANS, a Segunda Seção negou provimento ao EREsp 1.889.704/SP da operadora do plano de saúde, para manter acórdão da Terceira Turma que concluiu ser abusiva a recusa de cobertura de sessões de terapias especializadas prescritas para o tratamento de transtorno do espectro autista (TEA).
5. Ao julgamento realizado pela Segunda Seção, sobrevieram diversas manifestações da ANS, no sentido de reafirmar a importância das terapias multidisciplinares para os portadores de transtornos globais do desenvolvimento, dentre os quais se inclui o transtorno do espectro autista, e de favorecer, por conseguinte, o seu tratamento integral e ilimitado.
6. A musicoterapia foi incluída à Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde, que visa à prevenção de agravos e à promoção e recuperação da saúde, com ênfase na atenção básica, voltada para o cuidado continuado, humanizado e integral em saúde (Portaria nº 849, de 27 de março de 2017, do Ministério da Saúde), sendo de cobertura obrigatória no tratamento multidisciplinar, prescrito pelo médico assistente e realizado por profissional de saúde especializado para tanto, do beneficiário portador de transtorno do espectro autista.
7. Segundo a jurisprudência, o reembolso das despesas médico-hospitalares efetuadas pelo beneficiário com tratamento/atendimento de saúde fora da rede credenciada pode ser admitido somente em hipóteses excepcionais, tais como a inexistência ou insuficiência de estabelecimento ou profissional credenciado no local e urgência ou emergência do procedimento, e, nessas circunstâncias, poderá ser limitado aos preços e às tabelas efetivamente contratados com o plano de saúde.
8. Distinguem-se, da hipótese tratada na orientação jurisprudencial sobre o reembolso nos limites do contrato, as situações em que se caracteriza a inexecução do contrato pela operadora, causadora de danos materiais ao beneficiário, a ensejar o direito ao reembolso integral das despesas realizadas por este, a saber: inobservância de prestação assumida no contrato, descumprimento de ordem judicial que determina a cobertura do tratamento ou violação de atos normativos da ANS.
9. Hipótese em que deve ser mantido o tratamento multidisciplinar prescrito pelo médico assistente para o tratamento de beneficiário portador de transtorno do espectro autista, inclusive as sessões de musicoterapia, sendo devido o reembolso integral apenas se demonstrado o descumprimento da ordem judicial que deferiu a antecipação dos efeitos da tutela, observados os limites estabelecidos na sentença e no acórdão recorrido com relação à cobertura da musicoterapia e da psicopedagogia.
10. Recurso especial conhecido e desprovido

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Advogado, educador, professor e ativista. Mestrando em Direito, LLM em direito corporativo, pós graduação em direito do consumidor, civil e processo. Fundador da LigaTEA – Advogados que Defendem Autistas. Licenciatura em letras-português, consultor educacional, pós graduação em docência e metodologia da pesquisa científica, pós graduação em informática educativa, pós graduação em neuroeducação e pós-graduando em análise comportamental aplicada ao autismo. Pai do Benjamin (autista 9 anos).

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