9 de agosto de 2024

Tempo de Leitura: 3 minutos

Proposta aprovada pela Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Câmara dos Deputados gera críticas de entidades sociais

No dia 4.jul.2024, a Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei número 5679/2023, que prevê a exigência de autorização judicial para promover a esterilização forçada de pessoas com deficiência mental e intelectual sob a justificativa de não serem capazes de expressar seus desejos, por meio das cirurgias de vasectomia para homens e laqueadura para mulheres.

Publicidade
Livro: Autismo — Não espere, aja logo!

De acordo com o texto da proposta, de autoria das deputadas Carmen Zanotto (Cidadania-SC) e Soraya Santos (PL-RJ), quando o procedimento for autorizado, ele terá prioridade em relação aos procedimentos de esterilização cirúrgica eletiva. Além disso, a proposta exige que o Ministério Público se manifeste a respeito da realização dos procedimentos via judicial.

Primeiramente, a proposta aprovada na Comissão é inconstitucional porque viola os artigos 226 da Constituição Federal de 1988, que assegura o direito de homens e mulheres a tomarem decisões sobre os seus direitos sexuais e reprodutivos, e ainda o artigo 11 da Lei Brasileira de Inclusão (LBI), que proíbe a pessoa com deficiência de ser submetida a procedimentos cirúrgicos de forma forçada.

Além disso, fazendo uma breve leitura do texto original da proposta no site da Câmara dos Deputados, percebi uma carência de argumentos científicos na justificativa da proposta, assim como a falta de detalhes sobre quais tipos de deficiência se encaixariam na medida, e quais outras categorias seriam excluídas. Nesse sentido, o PL 5679 abre um sinal de alerta para a tentativa de controlar o direito das pessoas com deficiência ao acesso aos seus direitos sexuais e reprodutivos por meio da eugenia.

A eugenia e a Segunda Guerra Mundial

A eugenia é um conceito que surgiu na Inglaterra no ano de 1883 e foi espalhado em países como Alemanha e Estados Unidos no início do século passado. Partia da ideia de que era preciso promover a exclusão de elementos indesejados da sociedade a fim de melhorar geneticamente a população. Durante a Segunda Guerra Mundial, com o Holocausto contra os judeus feito pelos nazistas, mais de 400 mil pessoas foram esterilizadas de forma forçada.

Na década de 1990, um episódio semelhante aconteceu aqui na América do Sul. Durante o regime do ditador Alberto Fujimori no Peru, seu governo promoveu a esterilização forçada de 350 mil mulheres e 25 mil homens, medida esta que fazia parte do Programa Nacional de Planejamento Familiar no país. Fujimori, aliás, foi condenado pela Justiça Peruana em 2021 por Crimes contra a Humanidade.

Portanto, em pleno século 21, onde vivemos um amplo acesso à informação e com importantes conquistas para as pessoas com deficiência, especialmente nós autistas, assistir a tentativas de controle da saúde sexual e reprodutiva sob a justificativa de controle social não é o melhor caminho. Pelo contrário, é abrir um precedente perigoso para que o país retroceda em avanços históricos por conta de uma guerra cultural.

Quando falo aqui em direitos sexuais, não estou incitando a falar sobre sexo como erroneamente vemos as pessoas falarem por aí. Mas sim criar condições e instruir a pessoa com deficiência, seja ela autista ou não, para que tenha condições de conhecer o seu próprio corpo e também ser orientada a se proteger contra os abusos sexuais.

Segundo dados do Disque 100, ligado ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC), foram registradas no primeiro semestre de 2023 mais de 40 mil denúncias de violência sexual contra pessoas com deficiência. A maioria das vítimas foram mulheres com deficiência.

Quais os próximos passos do projeto na Câmara

Depois de ter sido aprovado na Comissão de Direitos da Pessoa com Deficiência na Câmara, o projeto precisa passar ainda pelas comissões de Previdência, Assistência Social, Adolescência e Família, e de Constituição e Justiça e Cidadania. Para ser aprovado, ele precisa ser encaminhado ao Senado Federal antes de seguir para sanção presidencial.

COMPARTILHAR:

Jornalista, autista e ativista na luta antirracista.

Jamef Transportes mostra como unir o autismo a ‘uma operação com propósito’

As barreiras e os impactos do diagnóstico tardio em pessoas com TEA

Publicidade
Assine a Revista Autismo
Assine a nossa Newsletter grátis
Clique aqui se você tem DISLEXIA (saiba mais aqui)