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Todo ano, no dia 18 de junho, a comunidade autista global celebra o Dia do Orgulho Autista, uma data dedicada à valorização das identidades autistas e ao reconhecimento da diversidade dentro desse espectro. Originado em 2005, pela organização britânica Aspies for Freedom, esse dia é marcado não apenas como um momento de celebração, mas também como um ato de afirmação política e social que busca ampliar a visibilidade e a compreensão pública sobre o autismo como uma identidade intrínseca e não como uma condição a ser “corrigida”.
Embora a lemniscata (infinito) com as cores do arco-íris seja o símbolo da neurodiversidade, no Dia do Orgulho Autista, ela serve para enfatizar a complexidade e a amplitude do espectro autista e reflete a ideia de um sem-fim de diversidade de cérebros e a união entre diferentes vivências dentro do espectro.
Vozes da comunidade
Para entender melhor o impacto da data, conversei com algumas pessoas autistas que compartilham suas experiências e a importância desse dia para eles. “O Dia do Orgulho Autista tem como significado representar todas as lutas e conquistas das pessoas autistas, por avanços em direitos e principalmente pelo reconhecimento das individualidades perante a sociedade. Eu como ativista da causa, em Araquari e no estado de Santa Catarina, falo diante de toda a minha trajetória e luta que essa data é a expressão do nosso protagonismo de fala, é dizer sobre nós mesmos, é manifestação da nossa identidade como pessoa e a desconstrução de preconceitos e estereótipos”, explicou Marco Antônio do Rosário, 21 anos, estudante de direito, diagnosticado autista aos 15 anos.
Para o artista e desenvolvedor de software Fabio Souza, o “tio .faso”, a data remete à aceitação: “O maior orgulho que poderíamos ter é falar abertamente quem somos e sermos aceitos plenamente em nossos empregos, sem medo de perder eles por sermos autistas”, exclama Faso, que se define como “bonequeiro profissional, designer de formação e ilustrador por paixão”, diagnosticado autista tardiamente.
“A educação desempenha um papel crucial para a evolução, desenvolvimento e autonomia dos autistas, que podem aprender em qualquer idade, mediante intervenções corretas, currículos adaptados e profissionais especializados. Com o processo de educação inclusiva falho que estamos presenciando, o número de autistas nas escolas vem decrescendo do ensino fundamental para o médio e superior. Em contrapartida, há o aumento substancial de casos diagnosticados. A falta de acesso e permanência na educação perpetua a invisibilidade dos autistas na sociedade”, argumentou Claudia Moraes, autista diagnosticada aos 56 anos, mestre em educação e mãe de um rapaz autista de 35 anos.
Essas falas destacam não só a importância da aceitação, mas também a necessidade de uma representação mais precisa e respeitosa do autismo nos meios de comunicação e na sociedade em geral. A narrativa frequentemente focada apenas nos desafios enfrentados pelas pessoas autistas tende a obscurecer suas conquistas e contribuições significativas em diversos campos.
Impacto social e cultural
Além do aspecto pessoal, o 18 de junho possui um forte componente social. Ele chama atenção para as questões de direitos civis, acessibilidade e inclusão no ambiente de trabalho, na educação e em outros espaços públicos. “Queremos que as políticas públicas reflitam nossas necessidades reais e promovam uma verdadeira inclusão”, afirma Marcelo (nome fictício), ativista autista. Este dia também inspira organizações e instituições a revisarem suas práticas e a criarem ambientes mais acolhedores para todos.
“Eu posso dizer que não é fácil sentir orgulho de ser autista. Afinal, quem sentiria orgulho de ter dificuldades significativas? Muitas pessoas me questionam o motivo de eu expor ser autista publicamente no meu perfil e, francamente? Eu tenho orgulho justamente porque eu sofri muito durante a vida e sou um sobrevivente dessa sociedade hostil. Eu sofri e sofro com a rejeição até hoje, por vezes choro e me vejo sozinho em meio ao caos, mas eu aprendi que a vida não é sobre vencer e conquistar, mas sim sobre o quanto você aguenta ‘apanhar’ e continuar tentando. Eu acredito que eu apanhei muito e vou continuar apanhando, mas permaneço com a cabeça erguida. O dia do orgulho autista não é sobre sentir orgulho de um transtorno do neurodesenvolvimento, mas sim sobre aceitar a minha identidade, isso é muito importante!”, revelou Wallace de Lira, de 25 anos, autônomo, estudante de psicologia, ativista da causa, diagnosticado autista somente aos 21 anos, apesar de ter tido uma suspeita aos 10 anos de idade.
A celebração do Orgulho Autista vai além das fronteiras, conectando pessoas autistas ao redor do mundo através de eventos online, webinars e campanhas de sensibilização. Essas atividades são cruciais para fomentar uma comunidade global que apoia e valoriza as pessoas autistas, oferecendo-lhes plataformas para compartilhar suas experiências e desafios.
Educação e conscientização
A educação desempenha um papel crucial neste processo. Iniciativas e recursos educacionais são desenvolvidos para disseminar conhecimento sobre o autismo de maneira respeitosa e fundamentada. Escolas e universidades são incentivadas a incorporar a neurodiversidade em seus currículos e práticas pedagógicas, preparando uma nova geração para interagir de maneira mais inclusiva e informada.
Além disso, famílias e cuidadores são encorajados a entender melhor o autismo através de materiais educativos e eventos — presenciais e online — que são frequentemente disponibilizados durante este mês. A informação é uma ferramenta poderosa que pode transformar perspectivas e melhorar a vida de pessoas autistas, promovendo uma sociedade mais inclusiva e justa, além de ser o principal instrumento contra o preconceito — ou capacitismo, termo que se refere à discriminação enfrentada por pessoas com deficiência (PcD).
Um futuro inclusivo
Ao olhar para o futuro, o Dia do Orgulho Autista representa uma promessa de continuidade na luta por reconhecimento, acessibilidade e igualdade. A cada ano, essa data reforça a importância de ouvir e entender as vozes autistas, além de reconhecer o autismo como parte integrante da diversidade humana. A data é um lembrete de que cada pessoa no espectro tem o direito de viver plenamente e ser respeitada.